19.4.09

FRIO (difícil dizê-lo em voz alta)

Poderia ser 57 de Agosto de 1923...
O tempo é uma existência cheia de improbabilidades.
Nos ecos escutam-se
orações repetidas de tédio
e há quem caminhe pelo vício
de não se imaginar em amor confinado
ao luto de ser apenas dois.

Inventei-me num vestido
compilado em livro.
Na página 1 lia-se exacatamente a mesma coisa
do que na página 45.
Repetia-se o escrito na página 97
e de tanto leres as mesmas fotografias,
pousaste o livro.
De seguida,
pousei-me também num livro
e numa atitude de bucólica esquizofrenia,
inventei paisagem numa noite mais longa
do que eu.

Devoraste o tecido
para que a minha nudez te surpreendesse,
ou então foi só o indistinto desejo :
pousar corpo como quem pousa cansadas asas,


Retalhos de ave
davam forma às nuvens,
Quando choveu o desepero esvoaçou-se na água.

Se não fores capaz
de escutar
o enorme edificio de silencio
onde assentei as casas e os dedos,
revira de novo o meu corpo,
aponta-me para sul.
O norte,
constataram as nossas sedes diluidas numa só,
é uma estratégia pérfida
e a nostalgia é a acidez do coração.

Deixa que os meus cabelos recuperem a cor
do incêndio,
corpo queimado
a contraluz
num papel de parede colado
por improviso à porta de mim.

Sabe-me a romã este pêssego
que me chega fora de estação.
Não durmo mais do que cinco minutos
há muitos anos,
sinto uma dor que
me queima a intimidade.
Já não me revelo,
suspensa na fotografia por materializar.

No fundo, andava a buscar alguém
para amar,
alguém que fosse novo
e acreditasse na beleza dos pássaros.
mas como esqueci o código que sela a natureza
em castidade,
encontrei as sete magnólias transformadas em manequins
de gosto duvidoso.


Eram mil poemas e um músico sem guitarra.
De pásssaros,
percebo a distância.
Asa, casa,
derrubo a primeira parede
onde escrevera o teu nome
a tinta de água.

Aumenta o volume da música.
dança mais uma vez,
desliga o fluxo
que te leva nas avenidas do sangue alheio,
Vamos começar pelo lado prodigioso
do riso,
ouvir em repeat o tema
que cobre de amor a pele.

A água seca a cor
inebriando de espectros luminosos
a tua palidez.
visto a milimétrica distância
tens a aparencia de um anjo
derrubado em jogo de matraquilhos.

Estende de novo o tabuleiro,
joguemos o corpo a dinheiro,
ou a qualquer coisa de fútil
que não faça poemas quando se ausenta,

cansa-me esta tardia melancolia,
a poesia serve-se fria?
(...)

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