31.5.10

Turbilhão ou se esta roda girasse sempre em redor do sol...

uma forma única desenhada nas nuvens, repito a lenga-lenga do azul,
deixando deslizar as letras para longe, até serem apenas um anagrama incompleto:
LUZ.

pus-me a pensar nas dicotomias bizarras,
emocionei-me,
escuta:
duas longas mãos com o eco de pérola,
um lago de ouro em vez de um corpo,
uma canção em vez de uma morte.

no céu deste lugar,
a solidão é um estado de graça,
um planeta pode ser quadrado e pressagiar infinito,
um coração pode rodopiar-se no seu próprio pião,
ou procurar-se imaturo,
como quem pela primeira vez  -finalmente- cresce inteiro.

Preciso avisar-te:  um incansável fantasma maquilha a angústia,
e natural que haja vinho no copo,
água na turbina deste motor vivo.

será ilusão permitir este mergulho?
diamante, dinamite,
uma inconstância corta-me as garras,
acalmando o felino com êxtase,
essa droga que faz ceder os tendões do arrependimento.

tudo é outra vez o novo, de novo.
o gato espera um tapete que voe,
Aladino quimérico,
consome o retrato com a tua fotografia de passe,
passando primeiro a tua rua,
depois a tua fúria
-hoje gira para ti!-
guarda-te num bolso cheio de janelas,
cobiçada arquitectura da morada que não prometes.

é um gato e está cansado,
aninha-se no meio do tufão,
contrariando a ciência,
voa...

18.5.10

ainda sobre tamanhos, alturas, compassos e medições

Não arrastes o relógio, deixa-me debruçar sob o ponteiro,
reparar o lapso da linha que se pressente a desmoronar.

as matérias dos meus vícios brilham nesse palco,
chamado TEMPO,
mutáveis e gigantes,
já foram moldadas por outras mãos,
reconhceidas por outros narizes,
Miró deitado ao meu lado, recorda-me
as constelações,
por isso dedico-lhe
-dedilho-lhe-
esta metáfora,
enquanto aprendo novamente a comover-me,
a sentar-me direita numa cadeira torta,
a cozer batatas para apedrejar o ruído do meu coração.

Acrobatas e poetas,
chamados á recepção!
- a mulher onírica tem caprichos,
quer chorar!
Sozinha não consegue,
tentou, inutilmente:
espetou a agulha no mesmo sítio,
oito vezes, sem parar.
As lágrimas  não vieram...
daqui a uns anos, quando se lembrar,
terá nos olhos esse rio,
essa consequência.

A MEMÓRIA É O KARMA DOS DESASSOSSEGADOS.

Por agora é tudo,
tenho o compasso quebrado
e ainda gostava de desenhar um sol
ou um daqueles rostos que fazía quando
pensava que as caras eram todas iguais redondas e a sorrir.

Vai tarde esse tempo,
julgo que Maria ou Francisca saberão do que falo,
mas elas são os tesOUROS calados,
a navegar num outro mar.

Regresso.
O relógio afinal, esteve sempre parado.

17.5.10

DEDOS

Este poema em gerúndio recorta-se,
junta-se para formar a inesquecível película deste retrato,
mas tem sépia no eco,
quer-se em púrpura,
que é esse incêndio atrás da paisagem.

Os dedos podem ser gente,
repara como se movem, como se limpam,
são rápidos!
Também os dedos dedilham,
fazem um tricot malabarista-
sabia que te comoveria este meu modo inseguro de fracturar o tédio,
mas ao que chamarias cinética,
eu chamei vulcão.

Eu sou pequena,
muito pequena...
não me corras se eu te doer,
aparo a franja deste destino,
mas sou descuidada,
só quero livros escritos,
letras em cima de letras,
e mais uma vez,
letras em cima das minhas letras que soletram o teu nome.

se tiveres o copo vazio, aguarda pacientemente a tempestade

Este poema está cansado,
vai ler uma revista da sua actualidade,

Lá fora -pelo menos tão cedo- não voltará a ser Primavera.