24.12.13

AL_Tacuba 12/12 Kronos Quartet


Solstício invertido.
Parte 1, livro primeiro, tabula rasa e tudo cheio na sala de mim.

O copo cheio invoca um certo sentido poético,
embora só haja vinho azedo sob a mesa
(é para o gato)
Quanto a mim, tenho sede.
Por ora, apetecem-me rusgas e incêndios,
coisas de banalizar os santos,
redimir unhas roídas, achaques, promessas,etc, etc...

PAUSA.
Chega este ímpeto e as estantes inteiras, íntegras, incendeiam-se...desintegrando-se em amadas formas.
(Será da tempestade? Serei uma tempestade?)

Não vendo no meu sentir uma clarividência apaziguadora,
Marguerite Duras junta-se ao meu corpo e escreve-lhe por cima:
"Thérèse sou eu. Aquela que tortura o delator sou eu. 
E sou aquela que quer fazer amor com Ter, o miliciano. 
Eu.
Dou-vos aquele que tortura com o resto dos textos.
Aprendam a ler:´
são textos sagrados."

(Ninguém está habituado a amar uma fora da lei)

Por isso, compreendera:
a angústia não nascia de ti para mim,
era eu que provocava a demência,
amordaçada num estilo antigo e minguante de escrever amor.
Percebi que os poemas, se repetidos até à exaustão, tornam-se glóbulos essenciais,
dão riqueza ao sangue, como o ouro dá aos dentes dos exilados,
mas, no reduto, são dependências que fragilizam vôos e paraísos.

Assim, arquitecto um plano já escrito noutros corpos:
"eu estava prestes a levantar voo da prisão da minha imaginação, mas ele
leva-me para o seu quarto e aí vivemos um sonho, não uma realidade." Anais Nin
E deixo ao corpo o corpo,
o baile, a merenda seca na relva.
Enquanto ao longe o gato bebe o vinho e, pela primeira vez,
morre.




23.8.13

POSSESSED II_para não bailar


Falar-te deste deserto que foi capotar a alma,
seria levar-te a uma ruína antiga onde arde em chamas um anjo sideral.
O momento - já que tão insistentemente mo pedes-
é este e chama-se corpo com dor
(ou uma dor com um corpo dentro)

Vislumbrando a cratera e não a lua,
talvez chorássemos os dois, extremamente meninos,
inseguros de nós próprios no futuro -este- que a vida preparou com um requinte perverso.
A poesia não seria feliz, embora desarmante de tamanha sinceridade.
Só por isso -apenas isso- valeria amar esse poema com unhas e dentes,
sobreviventes sôfregos do desejo de utopia.

perdi o incenso, 
a casa cheira a ranço velho.
sei que te enoja a imagem desta feiura.
sabes como odeio asas sujas, fracas para voar.

Tenho o fígado enfiado em pó de estrelas moribundas,
daí a fraca convalescença,
diz-me o pedalar de um velho fula que apesar dos olhos cegos de doença,
olha-me profundamente.
O cão -também doente-  sangra,
bastaria um comprimido pequeno, barato,
para curar todos os cães do mundo.
Bastaria um cão curado para valer a pena padecer tão violentamente.

Porém nada,
apenas uma cintura estreita a alargar o oceano,
uma distância que me retira do acto de viver em transe,
um pão vazio e esta ala de ausências.


















15.7.13


Se porventura amávamos o mesmo sabor a rum,
o rum -que era o mesmo, importa sublinhar- sabia diferente a cada um.
Por isso, o amor é uma semente rebelde (disseram-me ser também uma oportunidade),
embora nauseabunda, fascinante, viral,
de inconstante germinação.

Quando te segurei o sorriso (desde sempre pesado como uma pedra frustrada)
jurara transportar-te triunfalmente para o lado solar.
Para atravessares o caminho isento de perigos,
consertei-o com matérias que eram intensamente eu:
os meus segredos, as minhas ansiedades, os meus feitos heróicos depositados na palma da tua mão.

Apetecia-me devorar-te os lábios como quem finalmente adquire um corpo inteiro!
Dirigida pelo furor avançava,
comprei uma praia no Alentejo,
revelei-te do poeta, da utopia, do vinho forte,
mas essa fome passou e o corpo que era júbilo emagreceu de vontades.

Da lista de peripécias que foi desconstruir-nos o fascínio,
algumas valerão o lembrete:
um gato dividido (nossa herança matrimonial),
um apartamento suicida,
um bouquet de flores murchas num papel sem carimbo, nem promessa.

Por isso, a alma fez rock e quebrou a doçura da primeira penugem
para se dedicar a matérias mais ásperas, violentas.
Imperou a distância do óbvio que o fascínio não deixara ver:
tu levitas em ternuras estranhas,
eu sou um espectro a escrever uma carta sem memória.

"Walk in silence
Don't turn away, in silence
Your confusion
My illusion
Worn like a mask of self-hate
Confronts and then dies."
Joy Division





27.5.13

ligações (in) OU afinal falamos todos baixinho e ninguém nos ouve

"A poesia é um gesto eterno", é o nome de um blogue que encontrei mais ou menos ao acaso
Do Júdice e reencontrado com amor:

como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores 
do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos 
encontrar, que há-de ser um dia azul, de verão, em que 
o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí 
que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas, 
que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo 
das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros

Iremos devagar até esse maravilhoso precipício.
Marcarei a hora certa para que tudo certeiramente falhe.
A emoção da espera acende desejos encobertos,
o tamanho todo do amor (ou do desejo?)
Dirás disto, desperdiçar ponteiros de relógio, pontas de cigarro,
pontes que distam acertivamente as -nossas- impossibilidades.

Se for caso disso, inventarei recursos estilísticos
para moldar essa quimera:
tropicália,
rum amargo,
passaporte para qualquer destino,
surpreendente odor...o teu.

Antes organizarei a viagem com a minúcia do coração:
os teus olhos para rever,
os teus dedos para observar,
o teu corpo franzino de alma para prender...
momentaneamente.

Depois será manhã sem nenhum tipo de sacrilégio
ou talvez sobrevoe por ali uma pena de pássaro
e escorra a tinta certa para te descrever que em mim nada flutua,
tudo o que te parecer superficial, oco, desconectado,
será a minha melhor performance de gato assustado.
Nunca amo tão longe como o poema
-a torrente do poema-
ama-me a partir daqui ou vai.
Tudo o resto é sempre menor.

De qualquer forma vou propor-te esse passeio,
jantaremos por aí, desde que o vinho seja aceitável teremos motivo para continuar,
mais tarde um beijo, um baile e o regresso a casa.






12.2.13

Mito_Benjamim, muita infância e um piano dado a carícias

(imagem que me fascinou, encontrada em http://www.viralagenda.com/pt, transportada como mera ilustração)

Benjamim segurou-me no sonho.
                                                           sempre julgou essencial expor-me a transcendências

Eu chamava por Eupalino, o desertor, porque precisava de histórias para adormecer.
os sonhos têm rugas - disse-lhe -
tenho-os velhos, pouco seguros,
talvez quebrem, Benjamim...

Benjamim disse-me que os sonhos são enormes como torres altas de navios muito transparentes, frequentemente circulares,

            confesso que me custou imaginar  os seus ditos e feitos  sem retorquir plausíveis realidades
                                                                                                          plausíveis
                                                                                                          plausíveis
                                                                                                          plausíveis
COMO OS CANSAÇOS DE ONTEM, DE HOJE, AMONTOADOS.

Os sonhos?
-tocou num desfile de teclas muito harmónicas-
têm a leveza de coisas extremamente belas, frágeis, incomparáveis!
Todos, todos, todos!
- evitando radicalmente os condenados a humanas excepções-
flutuam ao redor de cada partícula,
preenchem ecos, corpos , vasilhas e frascos vazios de compota doce.


eu chamava por Eupalino porque precisava de sonhos para acordar.


O dia tem espinhas de peixe privado de guelras,
por aqui não paira noite nem dia, Benjamim...
como explicar-to sem te ofender a récita?
Tenho carradas de vida a transbordar melancolia!
não me cabe a faca na mão,
o pão está duro, sabe amargo,
encolhe em migalha, entope o segundo!
Eupalino inspirara-me num segredo antigo e grego
- coisa de deuses ou de magos-
a de fundir forma e função numa massa só.
Rapidamente aprendi que a projecção de palavras cortantes,
atraem o escorrer do sangue como um choro longo de birra de menino.

Benjamim enviou um lobo ou tornou-se lobo,
não posso assegurar,
ciente de que a sua função era a de guardar aquele jardim onde costurei toda uma ausência,
julgando que me cativava a jaula florestal da mitologia,
que só por ela transcendia à minha angustia mortal.

Não te enganes com o que queres ver, Benjamim,
fiz amizades neste reino, Benjamim, arranquei os caroços do chão para que floresça um esplêndido desterro,
gosto de mãos sujas e de linhas que terminam em feitos concretos:
pacotes de massa, latas de conserva, livros de poesia.
Resumi tudo a palestras vazias, gravações radiofónicas de dificílima difusão,
Eupalino era o meu noivo principal, mas eu a-Mara muitos homens, muitas mulheres, diversas flores e alguns animais,
uma desordem que implicava bastante desapego a formas materiais, metafísicas, surreais.

Apoio agora o esqueleto numa reluzente carapaça de tartaruga milenar,
Benjamim, recentemente feito chinês, oferecera-ma de presente jurando entregar-me assim o universo.

Eupalino perdeu-se num  solilóquio longo como um túnel em nada desfasado das proporções mais certas e introspectivas da solidão.

Embora contrariada, encerrei-o num livro.
A imagem da capa estava triste como um campo de papoilas suspensas.

2.1.13

POSSESSEDDDDPOSSEESESSEDPOOOOOSSSEEEEEESSEDESEDDEEEEEEd (Balanescu Quartet 16:57) OU o primeiro poema do ano


Decreto por virtualidade a necessidade URGENTE de respirar (mos) !

Havemos de ter incêndios -diversos- na pele, nas ranhuras da alma, nos limites dos dentes.
Fracturas delirantes ou farturas -de sabor deveras duvidoso- a lembrar-nos de que a vida é tal e qual uma pequena feira (repetida), 
num pequeno largo, 
numa pequena rifa a fazer-nos rir de coisas pequenas (as enormes).

Amanhã seremos aparentemente salvos -e cada vez mais sós-
ah, não percam tempo a interpretar a casualidade da alma humana!,
um verso tem a força de um pensamento presente!
(embora persista, arda, fulmine, sangre, transforme)

Na comunidade, como por exemplo essa, onde o Pacheco (ainda) dança doido e tonto como uma estrela demente,
as mulheres amam-se pelo que de belo têm
e o belo é o silêncio...

1ªvolta da dança:
Vá, vamos!.......................................................................................................................
-  isso é utopia. isso não é esse tanto. a poesia -se dessa estirpe- que se esfregue com limão, que fique ácida e corroa!

2ª volta da dança:
Cresço em modo gerúndio e imperfeito.
Talvez assim se explique o intuitivo rasgo de viver,
o apelo para a escuta do coração
(do teu também. do teu, essencialmente.)
O verdadeiro dialecto -esse, o que não foi dilacerado-
sobrevive encarcerado, celular, vibrante, sensível.

Sem voltas:
Transtorna (-me) a ordem certa do relógio
-para que se saiba, parti o vidro dessa estatura e fiz dos ponteiros raios que me partam e,
esses, que me iluminem ou devorem-
Vou procurar o tempo em ti, no outro, além, ali.
Vou rasgar o itinerário todo, 
incinerar o umbigo, fortalecer a anterior identidade.

À planta dos meus pés oferecerei cometas,
a profecia certa para danças ou conversas
(dói-me a dor que há-de vir, acende-me a alegria que há-de ser)

O calendário cai como folhas de Outono,
tenho sono, 
cesso a paródia,
venham mais cinco ou seis,
se formos muitos podemos rimar a vida com liberdade 
e IR...



finalmente.