28.6.11

A biografia do homem do lado de lá

Em termos práticos aconteceu assim:

Cansado de sonhar com o sofá fez-se à noite,
sem farnel, a fome comeu-lhe as estrelas.
Tal atitude valeu-lhe um estado mais oniríco, mas pouco adequado:
o cabelo comprido como algas, ou evocações de algo
algo para ser dito,
como por exemplo, o modo raro de ser manequim da demencia,
ou de fazer reinar o imprevisivel riso  numa festa.

Tudo se tornara fora do lugar onde antes, agora, depois estivera,
por isso inadaptou-se dos modos e costumes,
inverteu hierarquias, definindo:
- MEU COMANDANTE É A LUA!

Porém, mantinha-se distintito na forma rara de decapitar jornais:
dormia sobre as noticias do mundo,
conjungando com as letras maiores os nomes dos  que mais amava:
Joaquim, o filho mais novo
(roubou o nome ao mítico avô português),
Raquel, a segunda mulher, a da voz doce como mel...
Machel, o rebelde libertador.

O seu nome não escrevia, o seu nome já não sabia.

Os pés em mutação: ora chatos, ora audazes, ora negros de pó de terra...pó sideral.
(depois de dar a alma ao cosmos perde-se a capacidade de distinguir céu de chão
e flutua-se)
Caminhando em tempo certo, marcando o desconcerto,
tatuava nos muros em letras garafais - Só Jesus salva! -
depois ria da afronta e da mentira.

Era assim a sua oração, incerta.

Ele ausentara-se do circunstancial mundo,
eu escrevia-lhe nas rugas uma ternura
que não sei partilhar.

De qualquer forma,
o poema é dele,
como é dele este navegar.



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