5.8.07

alto, muito alto OU o meu projecto é construir-te asas

"Klaus é um homem alto. Conheceu Johana porque ela olhou por cima de uma sebe verdíssima e olhou por cima de uma Primavera ainda mais cverde do que a sebe. Eles costumavam brincar:
Se tu não fosses tão alto, não te teria visto por cima da sebe.
E Klaus dizia a Johana:
Se eu não fosse tão alto, a sebe seria mais baixa."
Gonçalo Tavares in Um homem: Klaus Klump
Enquanto o teu coração ardia na palma das minhas mãos (quente, quente, muito quente), transportavas nos olhos uma luz profundissima, que cegava o deslumbramento. Eu passava horas a mirar-te na minha caixa de brilhos mentais.
Era também de pés enterrados na terra que caminhavas. Eu sabia que era um hábito apreendido e amargo, mas o que eu gostava era de te inventar asas no alto da cabeça, tornar-te aeroplano e voar contigo numa folha de papel ou de alface, tanto faz.
Também eras muito alto. Isso era cómico, porque tropeçavas nas árvores e os pássaros aproveitavam-se de ti, para construirem casas e fomentarem a espécie.
Tu rias da tua des- GRAÇA, desajeitado, com um fato tão comprido que ocupava os teus dez dedos de tecido inútil (sei agora que aqueles longos tecidos onde enredavas os gestos eram apenas para te esconderes do medo, para seres mais corajoso e sagaz, para pensares com mais... muito mais... velocidade). Eu ouvia-te, mas os ramos da atmosfera seduziam-me mais do que as palavras e eu queria escapar-me, volátil, e ensinar-te a voz do vento.
Nada feito, eras feito de bolo de bolacha, sempre com camadas diferentes e dificéis de penetrar. A minha curiosidade vacilava... talvez fosse teu o caminho por entre o arvoredo. Eu fico na montanha ou na planície. Sempre a ver-te, muito acima ou muito abaixo, debaixo dos meus olhos, ou enterrado nas minhas pálpebras., nas linhas da mão ou nas linhas do céu. Eu fico.Observo.
E sim, o meu projecto era construir-te asas.

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