8.4.11

Barco e marcha fúnebre



Começo por te contar novidades desse barco sem ré
( a ausência de uma nota musical -para que relembres- é razão suficiente
para falecer-se de maleitas várias,
como um riso que não se dá,
um baile que não se dança,
um copo que se atrasa e aquece - o INSUPORTÁVEL!)

O barco -esse pequeno utensílio das marés e dos brilhos - navegou doidamente,
invadindo caminhos que se outrora pudesse, desejaria sem cruzar,
porque antes era altamente quimérico,
um pouco mundano,
flectido, jenuflectido em actos de contrição duvidosa.-
e isso bastava-lhe para o livro de memórias.

Um barco tem madeira
-como porventura saberás-
corpo, alegria e desespero de troncos de árvore,
uma espécie de albergue de falecidas naturezas,
pescando outras espécies,
outras belezas.

Este barco não foi feito por mãos humanas,
cresceu dentro do seu próprio mar,
parido de loucura e alguns rituais
( as águas deste ser gritam alto ao impossível).

Não presumas milagre,
o barco nasceu para morrer,
e hoje há um triste funeral,
numa hora em que chegues de madrugada
para remendar as velas em chamas.

Não basta ser marinheiro para navegar sozinho,
este mar é traiçoeiro e gasta-te a tinta a escrever coisa nenhuma.

É um barco demasiado vivo para se importar com o fatal destino
da sua mortalidade.

Hoje vai tornar-se cimento numa parede esburacada,
esvaziar as ondas,
voltar à prodigiosa ignorância do desconhecido.

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