5.5.09

Dance

(Tinham passado 29 anos. Eu tinha finalmente percebido que sem leres a minha -patética- poesia, nada de mim saberias. Este poema está livre de metáforas. Suicidou todos os aforismos. Este poema é uma árvore plantada no teu jardim).

Nunca soube o que fazer de teu corpo,
tinha desajeitado o desejo,
ao ver-te inteiro e desnudado,
primeiro a pele,
depois o sangue,
depois a guelra e o peixe.
Eras tantos!
Ora terra castanha,
ora transparente água de beber,
ar inviolável de tocar,
casa insonora,
fogo que queima baixinho.
Viesse o poeta
e falasse de tudo o que arde sem se ver,
e então talvez te tocasse no ombro esquerdo.

Duas marcas!...
E as marcas, ficaram lá?...
Como não me eras estranho,
sempre te entranhei a melodia.
Já eras antigo
antes de me nascer corpo
e violinos.
Como te dizer dos teus dedos caídos
nos meus sentidos?

Segurei-te com pregadeiras
às raízes dos meus cabelos
para que crescesses comigo.
Nunca mais tesouras!
Nunca mais cortar-te!
Foram 33 metros de longa cabeleira
multiplicados pelas vísceras,
pelas guelras oxigendas,
pelo mordomo da casa,
que procurava nos escombros da terra
um limoeiro depenado
e rabanetes cor de ferida a sangrar.
Tu rias a bom rir,
que é uma forma de te dizer que o teu riso
-O TEU RISO-
me fazia feliz.

Haveríamos de ver juntos as Índias,
primeiro um caril saboreado ao sol,
depois um deus de papel incendiado
e um gelado de manga para finalizar.

Falo-te de coisas banais,
como quem te diz,
que contigo,
é tudo sempre em primeiro.
Não há corrida nem desvio.

Haverias de fotografar-me
num piscar de olhos.
Eu, vermelha, queimada de sol,
e mais uma vez o teu riso,
a tarde tão cheia
...não tardes,
não tardes...
que haveria de invejar os olhos de transeuntes
quedados em nós,
de espantos muitos.


As palmas dos pés,
já sabes,
estão manchadas de gravidade,
como as sobrancelhas,
ao ver-te suspenso no fio da montanha.
Não me caias,
suspira-me dentro
com bons fôlegos
e carícias de conversa lenta.
Estes são os meus dedos
e tu és o meu primeiro piano.
A melodia com que nos repetimos,
é sempre UM,
a primeira,
irrepetivelmente igual.
Eu tenho poemas em todo o lado
e todo o lado tem um poema que és tu.
Canto-te para dançar.

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